sábado, 9 de maio de 2009

Os gastos nas campanhas e o financiamento dos partidos

Sou dos que acham que se gasta demasiado dinheiro, muito dinheiro mesmo, nas campanhas eleitorais. Pensar que só para as eleições europeias os 5 principais partidos, no seu conjunto, admitem poder gastar mais de 6 milhões de euros é ultrajante, obsceno, imoral. E ainda temos pela frente, este ano, mais duas eleições.

Tenho escrito que o modelo de campanha e de esclarecimento das propostas políticas devia passar por menos papel e mais debate sobre as alternativas. Que em vez de grandes e pequenos outdoors, cartazes, pendões, aventais e esferográficas, que nada esclarecem, poluem o espaço visual, são apenas propaganda, se deveria alterar o paradigma, investindo em debates cruzados, entrevistas, sessões de esclarecimento, promovidos por iniciativa própria ou protocolada, onde tivesse de ser, nas televisões, nas rádios nacionais e locais, nas casas do povo, nas sedes das associações locais, enfim, em todos os espaços físicos com condições mínimas, por todas as cidades e freguesias deste País.

Conexos a isto surgiram as recentes alterações ao financiamento dos partidos. E de imediato se ergueu um coro inflamado de críticas, soltaram-se todas as indignações, os comentários coléricos por tudo o que é sítio: na internet, nas conversas de café e sobretudo nas palavras dos maldizentes do costume, onde quer que se expressem.

Sendo insuspeito, não posso alinhar neste coro. Pelo que tenho lido e ouvido, a maior parte das pessoas que se pronunciaram sobre este assunto, não sabe do que fala, não conhece as alterações produzidas, incluindo, ao que parece, figuras altamente respeitáveis, como João Cravinho, por exemplo.

Eu fui procurar ler quem me inspira confiança, à falta de melhor informação, para tirar as minhas próprias ilações, com a convicção de que quem faz da transparência, do rigor, do combate à corrupção, algumas das suas principais bandeiras, como é o caso do Bloco de Esquerda (e também do PCP), de algum modo estar comprometido com manobras e golpes, sem prejuízo de que por descuido ou uma má avaliação, pudessem ter cometido um grave erro. Não creio que tenha acontecido, lendo o Miguel Portas.

Deixo-vos com o post de Miguel Portas:

O que saiu cá para fora, com a chancela, entre outros, de Marcelo Rebelo de Sousa, foi que os partidos decidiram fazer “regressar as malas de dinheiro vivo”. Verdade?
Comecemos pelo óbvio: será que os partidos são suficientemente loucos para se meterem nessa quando têm 3 eleições à porta? Será que o faria o bloco, uma força que tem direccionado grande parte da sua actividade política para o combate à corrupção? Não parece razoável, pois não?
Então o que se passa na realidade?

1. Há uns anos o parlamento acabou com o “dinheiro vivo” e instaurou o critério do financiamento público dos partidos. O financiamento por empresas foi proibido - e bem; o financiamento por particulares passou a ter que ser feito por movimento bancário e foi limitado a 25 salários mínimos - muito bem. Ambas as medidas se mantêm. Não há qualquer alteração neste domínio, salvo a conversão de salários mínimos em IAS (o indexante de apoio social), o que não altera substancialmente, nem o montante (pelo contrário, baixa-o), nem os critérios.

2. Então porquê o “bruá”? Porque a lei alarga substancialmente o limite para as entradas de “dinheiro vivo” em iniciativas e realizações partidárias, estritamente contra a venda de bens e serviços e até 100 euros por pessoa. Aplica-se um critério similar ao do pagamento de quotas em dinheiro - até 1 IAS.
Errado? Certo. Os partidos de esquerda nunca defenderam o financiamento exclusivo dos partidos pelo Estado porque isso os “funcionaliza”. Sempre defenderam - e bem - que um partido deve realizar iniciativas e promover a recolha de fundos entre os cidadãos - porque disso também vive a democracia.
Uma pessoa vai à festa do Avante! e tem que pagar a sua cervejola com cartão? Tenham juízo os “anti-corruptores”. O bloco organiza um jantar com dois preços - um a 10 euros, outro a 20, de apoio - e todos os convivas têm que pagar de cartão bancário a sua inscrição na mesa dos pagamentos? Por favor…

3. Muito bem, mas à pála das pequenas contribuições não se está a abrir uma “caixa de pandora”? Não, não está. As condições em que este “dinheiro vivo” pode entrar são claras e não vagas. Por outro lado, isto não dispensa os partidos de apresentarem contas das despesas e receitas das iniciativas e a “recolha de fundos com bandeira” continua a ser interdita (não ha contribuições anónimas sem contrapartida em bens e serviços documentados).

4. Não me passa pela cabeça penalizar as forças de esquerda pelas qualidades que têm - de motivação para uma cidadania activa - em nome dos perigos de corrupção nos partidos centrais. Hoje, a fiscalização dos partidos é muito mais severa - e ainda bem. Isso limita a corrupção em favor dos partidos, embora não evite a corrupção dirigida aos seus dirigentes ou autarcas ou, ou… mas isso não é a lei do financiamento dos partidos que resolve, mas o levantamento dos segredo bancário, o registo dos movimentos de capitais e o fim dos paraísos fiscais.

5. Finalmente, a nova lei resolve dois problemas que a anterior criara: as segundas voltas das presidenciais não tinham mecanismo de financiamento previsto; as listas de cidadãos, idem idem, o que as coloca numa posição de concorrência agravada face às listas partidárias (Helena Roseta que o diga…)

Não é a minha lei - porque continua a manter escandalosamente altos os montantes máximos que os partidos podem apresentar nas disputas eleitorais - mas é uma lei que põe fim a uma discriminação indecente e que valoriza a participação dos cidadãos “de baixo” na vida política. 



Ler também Vitor Dias e Rogério Moreira.
blog comments powered by Disqus
 

Copyright 2009 All Rights Reserved Revolution Two Lifestyle theme | adquirido e adaptado por in coerências